"O mais antigo jornal que se tem notícia foi o Acta Diurna. O mesmo surgiu por volta de 59 a.C. a partir do desejo de Júlio César de informar a população sobre factos sociais e políticos ocorridos no império - como campanhas militares, julgamentos e execuções."

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O abraço da Adriana ao Sérgio ou a paz em tempos de cólera

O abraço da Adriana ao Sérgio

“Porque é que estão aqui?”

“Estou aqui porque é o meu trabalho.” “Mas não preferias estar connosco, deste lado?”

Tal como há imagens que valem por mil palavras, há silêncios com a mesma força. Foi o caso da não resposta do agente do corpo de intervenção à pergunta que Adriana lhe fez antes de o abraçar, numa imagem-símbolo da manifestação “Que se lixe a troika! Queremos as nossas vidas” do passado sábado, que juntou quase um milhão de pessoas em 40 cidades contra a situação desesperante do país.

Ao contrário do que algumas pessoas têm dito em comentários à fotografia, Adriana não foi contratada por nenhuma agência de publicidade, nem tão pouco é familiar do agente que abraçou. É, sim, uma aluna de artes de 18 anos que vive em Lagos e que, por estar na capital naquele dia, decidiu participar na primeira manifestação da sua vida.

“A razão para nos manifestarmos era boa, então decidi ir. A dada altura, quando vi polícias de intervenção, aproximei-me para ver o que se passava”, conta ao telefone. Um grupo de manifestantes tinha acabado de atirar tomates à sede da troika, na Avenida da República, e havia alguma tensão no ar. Adriana, que já tinha visto fotografias simbólicas de outros protestos e manifestações, procurou um agente para abordar, até porque “os polícias têm família como nós”.

“Foi muito simples: de todos os polícias ali, ele era o que tinha a máscara de plástico levantada. Então aproximei-me e perguntei-lhe: ‘Porque é que estão aqui?’” Porquê, perguntamos. “Porque, se é uma manifestação pacífica, não vejo razão para o corpo de intervenção estar ali. Ele respondeu-me que estava a trabalhar e eu perguntei-lhe se ele não preferia estar connosco.” O silêncio caiu aí. O polícia olhou em frente, “com olhos tristes”, e Adriana afastou-se a pensar na cara infeliz e na reacção que poderia ter perante ela. Levou dez minutos a decidi-la.

O agente já tinha baixado a viseira por essa altura. Isso não a impediu de o abraçar. “Sou contra gritos e contra mandar tomates, mesmo em protestos. Desejo um mundo sem ódio. Vi que ele queria estar connosco, então passei-lhe aquela mensagem de amor e de paz.” Ele ficou “surpreendido e acabou por tentar afastar-me, mas não bruscamente. Por acaso, até gostava de saber se ele está bem. Depois de ver a imagem, fiquei preocupada que pudesse ter problemas no trabalho só porque eu o abracei”.

Sérgio não teve qualquer problema com as chefias. Através da direcção nacional da PSP, chegámos ao agente abraçado. “Ali estávamos nós, em plena Avenida da República, com aquele oceano de gente pela frente. Já tinham sido arremessados tomates, garrafas de vidro, petardos que nos rebentavam aos pés e deixavam os ouvidos a zumbir... Mas o sentimento permanecia. Apesar de haver arruaceiros, tínhamos que permanecer calmos e, apesar de estar ali como agente do Corpo de Intervenção, também sinto na pele as decisões e medidas do governo”, explicou ao i.

O momento em que isso se manifestou”, acrescenta, “foi quando a Adriana se aproximou de mim e me perguntou porque estávamos ali. Respondi que era nossa função, que apesar de aceitar que as pessoas se manifestem, tinha que trabalhar. Ela perguntou-me então se não tinha vontade de me juntar à multidão e manifestar-me, e a minha reacção foi olhar para ela com um ar de quem assume: ‘Sim, estou convosco no sentido da manifestação e sou parte do seu sentido’ e olhei em frente para a multidão. Momentos depois ela voltou e simplesmente abraçou-me. Fiquei estático e dois segundos depois disse-lhe ‘Já chega’ e recuei ligeiramente.

Os dois segundos foram suficientes para nascer o símbolo de que, como alguns internautas têm comentado, “o povo perdeu a paciência, mas não perdeu a calma”.

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